Fertilizantes: Pode a agricultura destruir
nosso planeta?
Saiba como é possível cultivar todo o alimento de que necessitamos com menos adubos químicos
O escoamento superficial de fertilizantes ocasiona a proliferação de algas tóxicas. Esse florescimento cobriu um terço do lago Erie, na América do Norte, em 2011
N. Nitrogênio. Número atômico 7. Invisível e sem gosto. Mas está sempre em nosso estômago. Ele é o motor da agricultura, a chave da abundância em nosso mundo repleto de gente esfomeada
Sem esse elemento insociável, pouco propenso a se juntar a outros gases, não há como viabilizar o mecanismo da fotossíntese – nenhuma proteína pode se formar e nenhuma planta pode crescer. O milho, o trigo e o arroz, as safras de crescimento rápido das quais a humanidade depende para sobreviver, estão entre as plantas que mais absorvem nitrogênio. Na realidade, elas requerem mais nitrogênio do que a natureza consegue fornecer.
É aí que entra a química moderna. Depois de capturado por usinas gigantescas, o gás nitrogênio inerte na atmosfera é forçado a unir-se com o nitrogênio do gás natural – surgem assim os compostos reativos tão almejados pelas plantas. Esse fertilizante nitrogenado (do qual uma centena de milhões de toneladas são usadas a cada ano ao redor do mundo) é o que torna abundante as colheitas. Sem ele, a civilização humana em sua forma atual não existiria. O solo do planeta não poderia fornecer a todas as 7 bilhões de pessoas os alimentos a que estão acostumadas. Na verdade, quase metade do nitrogênio encontrado nos músculos e tecidos de nosso corpo surgiu em alguma fábrica de fertilizantes.
Todavia, esse milagre moderno tem um custo. O escoamento do excesso de nitrogênio sufoca a fauna silvestre em lagos e estuários, contamina os lençóis freáticos e contribui para o aquecimento global. Enquanto um mundo esfomeado se prepara para receber mais bilhões de bocas que precisam ingerir proteínas ricas em nitrogênio, o que restará de ar e água não poluídos em meio à crescente demanda por terras férteis?
O dilema do nitrogênio é explícito na China, um país que adora sua comida e teme a possibilidade de exaurir as fontes de abastecimento. Para um visitante, tal ansiedade soa despropositada. No restaurante San Geng Bi Feng Gang, nos arredores de Nanquim, acompanho, assombrado, o desfile de pratos: peixe no vapor, costeletas de carneiro fritas, sopa de flor de crisântemo e ovo, talharim com batata-doce, brócolis frito, inhame e vasilhas fumegantes de arroz.
“Você sempre se alimenta bem assim?”, pergunto ao cientista Liu Tianlong, um especialista em agricultura que está me apresentando aos cultivadores da vizinhança. O sorriso de menino desaparece e, de repente, uma sombra tolda suas feições. “Quando eu era pequeno, ficava contente ao receber três vasilhas de arroz."
Liu cresceu logo após a grande fome que assolou a China de 1959 a 1961, na qual se estima que tenham morrido 30 milhões de pessoas. A seca desempenhou um papel, mas o responsável pela catástrofe foi o presidente Mao, e seus caprichos. Promovido pelo líder chinês, o Grande Salto Adiante pressupunha a coletivização da produção agrícola e obrigou os camponeses a entregar as colheitas para uma burocracia centralizada.
Mesmo atenuada, a escassez de alimentos prosseguiu até o fim da década de 1970, quando os cultivadores retomaram o controle de suas safras. “No prazo de apenas dois anos, quase que da noite para o dia, havia comida em profusão”, relembra Deli Chen, que, menino, testemunhou essas reformas em um vilarejo produtor de arroz na província de Jiangsu. Hoje, ele é especialista em solo da Universidade de Melbourne, na Austrália.
Trabalhadores de uma cooperativa agrícola nas proximidades de Xangai dispersam fertilizante
pelos campos em que será plantada a safra de inverno de trigo. A China é o maior produtor e também o maior consumidor de adubo no mundo. O país chega a usar 60% mais nitrogênio
que o necessário - Foto: Peter Essick
No entanto, os lavradores chineses logo toparam com outra barreira: os limites das terras cultiváveis. A população da China incorporou 300 milhões de pessoas entre 1970 e 1990. Não foi nada fácil para a agricultura tradicional do país atender a essa demanda.
Song Linyuan, um lavrador idoso porém lépido de um povoado a nordeste de Nanquim, ainda se lembra da época em que mantinha seu meio hectare cultivável tão fértil quanto possível: fazia a compostagem do lixo doméstico e usava o esterco de seus porcos e galinhas. Isso significava o acréscimo de 110 quilos de nitrogênio por hectare ao ano. Ele colhia de 2 950 a 3 750 quilos de arroz por hectare. Essa é uma safra respeitável, uma produtividade melhor que em muitas regiões do globo. Mas hoje ele consegue o dobro disso: 8 170 quilos por hectare – resultado com que muitos produtores só conseguem sonhar.
O que fez a diferença? “Adubos melhores”, diz ele. Estamos sentados em uma loja em meio a outros agricultores. A resposta de Song Linyuan desencadeia uma discussão acalorada. Alguns concordam que o adubo é crucial; outros consideram mais importantes as sementes melhoradas. Na verdade, as duas tecnologias estão associadas. As variedades de arroz e trigo de alta produtividade desenvolvidas nas décadas de 1950 e 1960 apenas poderiam exibir todo o seu potencial caso recebessem outra dose de nitrogênio.
As autoridades chinesas procuraram assegurar que essas safras fossem bem adubadas. Entre 1975 e 1995, construíram centenas de usinas de nitrogênio. A fabricação de fertilizantes foi quadruplicada pelo país, e a China transformouse no maior produtor mundial. Song Linyuan agora usa cinco vezes mais fertilizante que antes. Os campos estão saturados de ureia – uma forma seca de nitrogênio –, lançada em punhados de grânulos alvos como neve entre os brotos verdes. Isso equivale a 600 quilos de nitrogênio por hectare. Os cultivadores de legumes usam ainda mais fertilizante. Alguns chegam a aplicar 1 ou 2 toneladas por hectare.
Poucos agricultores acreditam que isso pode ser danoso, mas os cientistas contam outra história. “O adubo nitrogenado é usado em excesso, em uma proporção de 30% a 60%, em campos de cultivo de manejo intenso”, diz Xiaotang Ju, da Universidade Agrícola da China em Pequim. Aplicados na terra, os compostos nitrogenados se dispersam pelo ambiente, alterando nosso mundo, não raro de maneira indesejável. Parte do nitrogênio é carregada das plantações para os rios ou se dilui na atmosfera. Outra porção é ingerida, sob a forma de grãos, por seres humanos ou animais de criação, mas, em seguida, retorna ao ambiente como dejeto ou excremento.
Deli Chen lembra-se das pescarias que fazia quando pequeno. “O rio tinha água translúcida”, conta. Mas aí, por volta de 1980, “era impossível ver os peixes”. A turvação devia-se em parte à proliferação de fitoplâncton, um sinal de que a água se tornou eutrófica (sobrecarregada de nutrientes). Um levantamento de 40 lagos chineses constatou que metade deles apresentava quantidade excessiva de nitrogênio ou de fósforo – com frequência, o adubo com fósforo é o responsável pela proliferação de algas nos lagos.
Um caso emblemático é o do lago Tai, terceiro maior do país, que, com frequência, é tomado por imensas proliferações de cianobactérias tóxicas. Em 2007, uma dessas florescências desenfreadas contaminou o suprimento de água a 2 milhões de moradores da cidade de Wuxi.
No solo há bactérias que se alimentam de nitratos e podem converter essas modalidades danosas de nitrogênio em sua forma original, e ambientalmente inócua, que constitui 80% de nossa atmosfera. Todavia, mesmo esse processo não deixa de apresentar problemas, pois essas bactérias também liberam óxido nitroso, um gás que contribui para o efeito estufa. “Resolver o problema da sobrecarga de nutrientes é meu sonho”, diz Xiaotang Ju, membro da “família do nitrogênio” na China, uma rede informal de cientistas dedicados a essa tarefa hercúlea. O patriarca da causa, Zhu Zhaoliang, alarmou os altos dignitários do governo ao fazer uma palestra, em 1998, sobre os perigos da poluição causada pela agricultura. O então presidente da China, Jiang Zemin, reagiu dizendo que não fazia ideia que a atividade agrícola podia ser tão danosa.
Esses cientistas começaram a trabalhar com grupos pequenos de lavradores, mostrando a eles que a redução do adubo, além de não diminuir as colheitas, pode ser vantajosa em termos financeiros. Também incentivam a compostagem e orientam a usar os adubos sintéticos apenas nos casos de maior necessidade. O obstáculo é que parte dos cultivadores não se dedica à atividade em tempo integral. Eles não têm interesse em economizar reduzindo o uso de adubo. Preferem poupar tempo e garantir seus empregos urbanos.
O temor de uma escassez de alimentos ainda assombra a imaginação dos chineses, o que faz com que as preocupações ambientais sejam suplantadas. Huang Jikun, diretor do Centro de Política Agrícola na China, tenta convencer as autoridades de que tal preocupação é despropositada. “Hoje a China tem mais segurança alimentar que nos últimos 5 mil anos!”, diz ele.
É provável que a China – e o resto do mundo – passe a usar mais, e não menos, nitrogênio nos próximos anos. Populações continuam a crescer, assim como o acesso à carne. A alimentação de rebanhos suínos ou bovinos requer um volume de produtos agrícolas bem maior do que se os cereais fossem usados na nutrição humana. “Se os chineses modificarem sua dieta para que fique mais parecida com a ocidental, a pressão sobre o ambiente será enorme”, comenta Xiaotang Ju.
Há um vislumbre de solução em uma fazenda perto da localidade de Harlan, no estado americano de Iowa. Ali, 90 cabeças de gado pastam em um campo viçoso, e centenas de porcos revolvem a terra, em meio a camadas de palha, rodeados de plantações de alfafa, milho, soja, aveia e cevada.
Ron e Maria Rosmann não aplicaram adubo nitrogenado nessas plantações. Pelo contrário, ele é acrescentado por meio de bactérias, que fixam o nitrogênio e vivem em nódulos nas raízes de leguminosas, como a soja e a alfafa (e também uma safra de cobertura de trevo-azedo no outono), e depois o liberam no solo, antes do plantio de milho na primavera. Parte desse nitrogênio é absorvida pelo milho, alimento para os porcos. O grosso dele acaba em esterco, que é levado de volta para adubar os campos.
O ciclo é novamente reiniciado. “Um de nossos objetivos é manter um sistema fechado”, diz Ron. “Somos um exemplo de como deve ser o plantio orgânico.”
Um agricultor amish espalha esterco e palha de seu celeiro em um campo recém colhido. O esterco fornece nitrogênio para a plantação do ano seguinte. Se aplicado da maneira correta, o fertilizante caseiro não adicionará o excesso de nitrogênio às fontes de água loc:ais - Foto: Peter Essick
Entramos por uma lavoura de milho, entre pés bem mais altos que nós. “Deve haver 5 toneladas de milho aqui. Há muita gente que diz: ‘Vocês, agricultores orgânicos, não vão conseguir alimentar o mundo’. Não é verdade. Veja esta plantação!”, comenta Ron com entusiasmo.
No entanto, também há desvantagens em seus métodos. Esse tipo de cultivo exige muito trabalho, e a natureza não tem a pressa de uma usina de nitrogênio. As safras que permitem o acúmulo do elemento no solo, como a de alfafa, não são tão rentáveis nem alimentam tanta gente, como as de milho, que consomem muito nitrogênio.
O Brasil também tem desenvolvido a agricultura orgânica, apesar de o uso de fertilizantes nitrogenados não ser problema tão grande por aqui – o país utiliza quantidade menor que a média global. Isso porque a soja, principal produto agrícola, prescinde desse tipo de fertilizante. Além disso, explica Antonio Dechen, da Universidade de São Paulo, “técnicas como o plantio direto, que preserva o solo da exposição direta a sol e chuva, e a inoculação de bactérias fixadoras do gás nitrogênio presente na atmosfera permitem aos produtores abrir mão do uso de nitratos”.
Já os Estados Unidos, com seis vezes mais terras aráveis por pessoa que a China, podem se dar ao luxo de plantar safras menos produtivas que protegem o ambiente, caso alguém esteja disposto a pagar por elas. O esquema funciona para o casal Rosmann, que recebe alguns recursos do governo e vende produtos orgânicos por preços altos.
Mas será que todos estarão dispostos a pagar caro? Poderiam os métodos orgânicos alimentar o país de maior população no mundo? Em Nanquim, Zhu Zhaoliang, em sua sala no Instituto das Ciências do Solo, dá uma gargalhada ao ouvir a pergunta. “Não resolve para a China.”
É provável que, no entanto, haja uma posição intermediária – colheitas excelentes, mas sem tanta poluição por nitrogênio – e algumas das plantações mais estudadas no mundo mostram o caminho a seguir. Esses campos de cultivo, cada qual com 1 hectare exato, fazem parte da Estação Biológica Kellogg, da Universidade Estadual de Michigan. Durante 20 anos, tais lotes têm produzido milho, soja e trigo em ritmo constante, proporcionando uma comparação de quatro maneiras de cultivar a terra, desde a costumeira até a orgânica. Tudo o que entra ou sai dos terrenos é medido com cuidado: chuva, adubo, o óxido nitroso emitido pelo solo, a água que se infiltra no lençol freático e, por fim, a colheita.
Phil Robertson, um dos responsáveis pela montagem desse experimento de longa duração, me acompanha na visita a essas plantações. Ele está ansioso para revelar dados novos e “muito surpreendentes”. Ao longo dos últimos 11 anos, cada um dos lotes cultivados de acordo com as recomendações regulares para aragem e adubação liberou 680 quilos de nitrogênio por hectare nos rasos lençóis freáticos da região. “Portanto, metade do adubo usado se perde”, diz Robertson. Tal perda é bem menor que a registrada na China. Mesmo assim, quando multiplicada pelos milhões de hectares cultivados nos Estados Unidos, é suficiente para contaminar os aquíferos, saturar de nutrientes o rio Mississippi e criar uma imensa zona morta no golfo do México.
As plantações orgânicas no experimento de Robertson, por sua vez, aquelas que não receberam nem adubo nem esterco comerciais, perderam um terço do nitrogênio usado – mas tais campos também produziram um quinto a menos de cereais. Curiosamente, as plantações que receberam pequenas quantidades de adubo, mas também foram protegidas por safras orgânicas de inverno, proporcionaram o melhor dos dois mundos: a produtividade média foi equivalente à dos cultivos normais, só que com perda de nitrogênio bem menor, quase no nível dos campos orgânicos. Segundo Robertson, se os fazendeiros americanos conseguissem diminuir as perdas de nitrogênio em níveis similares, os pântanos e cursos d’água recuperados poderiam dar conta de eliminar o restante. Tal como na China, porém, para muitos agricultores, não é fácil mudar. Quando está em jogo a sobrevivência da família, pode parecer melhor recorrer a uma quantidade maior, e nunca menor, de adubo.
Da perspectiva da África, o problema do uso excessivo de adubo comercial parece restrito às nações ricas. Os lavradores africanos usam quantidades reduzidas de fertilizantes – em média, apenas 7 quilos por hectare. Práticas alternativas, como adubação com esterco ou safras de leguminosas, também têm sido raras.
Nas áreas rurais da África, muitos plantadores acabaram submetidos a um conjunto de círculos viciosos. Com medo da fome, eles se concentram em safras, como as de arroz ou milho, que oferecem o máximo de calorias, mas tendem a retirar nutrientes do solo. Nessas terras exauridas, as colheitas são piores ano após ano, impedindo que os agricultores tenham recursos para a compra de adubo. A pouca demanda desestimula a produção local e o fertilizante importado é caro.
Os solos africanos estão solapados. As reservas naturais de fertilidade – os nutrientes armazenados na matéria orgânica de raízes e folhas em decomposição durante os séculos anteriores – diminuem à medida que a agricultura extrai mais nitrogênio, fósforo e potássio do que repõe. Isso deixa a terra incapaz de alimentar as pessoas – “um roteiro para o desastre no longo prazo”, segundo o Banco Mundial.
O rendimento médio das plantações de cereais na África subsaariana gira em torno de 1 tonelada por hectare, um quinto da média chinesa. Quase todos estão de acordo: os agricultores africanos precisam de volume maior de nitrogênio para melhorar suas colheitas e a vida. No entanto, há um debate exaltado e amargo sobre qual deveria ser a origem desse nitrogênio.
Para alguns, como Jeffrey Sachs, do Instituto da Terra na Universidade Colúmbia, o aumento na produção agrícola requer nova adição de adubo comercial e, se os agricultores africanos não têm condições de comprá-lo, então, deveriam ser subsidiados pelas nações ricas. Em 80 povoados distribuídos por uma dezena de países, o Projeto Povoados do Milênio, dirigido por Sachs, distribui sacos de adubo e sementes melhoradas. Em povoados de Tanzânia, Quênia e Malauí, a produção de cereais dobrou da noite para o dia.
Em 2006, o governo do Malauí passou a fornecer adubo barato à metade dos agricultores do país. A produção de milho dobrou – embora isso se deva também a uma boa temporada de chuvas. Esses programas, contudo, estão ameaçados por dúvidas quanto ao futuro. Subsídios para fertilizantes foram experimentados em vários lugares na África durante as décadas de 1970 e 1980, mas acabaram abandonados por serem muito dispendiosos e fonte de corrupção. O atual programa de subsídios do Malauí encontra problemas – como a falta de recursos estatais.
Ainda que grande parte do planeta sofra com os efeitos deletérios do excesso de nitrogênio, isso está longe de acontecer nas terras de cultivo africanas. A leguminosa Faidherbia albida oferece uma solução alternativa. Suas folhas, assim como as bactérias que vivem nos nódulos da raiz da árvore, fertilizam as plantações - Foto: Peter Essick
“O continente africano não tem como financiar quantidades maciças de adubo”, diz a agrônoma Sieglinde Snapp, da Universidade Estadual de Michigan. Uma abordagem viável, segundo ela, seria um uso maior de plantas fixadoras do nitrogênio. Milhares de famílias no Malauí começaram a cultivar feijão-guandu e amendoim em suas terras, substitutos de parte dos milharais. Trata-se de um experimento de dez anos, iniciado por hospitais, agricultores e agrônomos locais.
Como o guandu e o amendoim tornam o solo fértil, a colheita de milho na safra seguinte é maior – o que compensa o fato de uma área menor ter sido plantada com milho. “Menos milho resulta em mais milho”, diz Sieglinde. Além disso, a colheita adicional de feijão-guandu possibilitou uma dieta nutritiva e proteica. “Eles tiveram de aprender a usar as leguminosas. Foram 20 anos de trabalho. As pessoas mudaram seus pratos cotidianos”, conta a agrônoma.
A conclusão de Sieglinde – de que a produção e a conservação de nitrogênio vão exigir conhecimento e paciência consideráveis – coincide com a opinião de muita gente empenhada nessa busca mundial. Quando perguntado sobre o que é determinante para a agricultura chinesa, o especialista em solo Zhu Zhaoliang responde: “Mais escala” – ou seja, plantações maiores e bem manejadas. Ron Rosmann, em Iowa, explica que o cultivo sem o acréscimo de nitrogênio comercial “requer manejo, trabalho e mais atenção aos detalhes. Somos um tanto fanáticos”.
Um século atrás, quando o químico Fritz Haber aprendeu a extrair nitrogênio do ar, os fertilizantes sintéticos pareciam um atalho para se evitar a escassez, pois asseguravam o suprimento do nutriente essencial para a agricultura. No entanto, são evidentes os limites no uso do nitrogênio. Agora, as inovações que nos salvarão – e ao planeta – talvez não saiam do laboratório químico. É possível que venham de agricultores e plantações em todas as partes do mundo.
por Dan Charles
Fonte:http://viajeaqui.abril.com.br/materias/fertilizantes-pode-a-agricultura-destruir-nosso-planeta?pw=1
Sem esse elemento insociável, pouco propenso a se juntar a outros gases, não há como viabilizar o mecanismo da fotossíntese – nenhuma proteína pode se formar e nenhuma planta pode crescer. O milho, o trigo e o arroz, as safras de crescimento rápido das quais a humanidade depende para sobreviver, estão entre as plantas que mais absorvem nitrogênio. Na realidade, elas requerem mais nitrogênio do que a natureza consegue fornecer.
É aí que entra a química moderna. Depois de capturado por usinas gigantescas, o gás nitrogênio inerte na atmosfera é forçado a unir-se com o nitrogênio do gás natural – surgem assim os compostos reativos tão almejados pelas plantas. Esse fertilizante nitrogenado (do qual uma centena de milhões de toneladas são usadas a cada ano ao redor do mundo) é o que torna abundante as colheitas. Sem ele, a civilização humana em sua forma atual não existiria. O solo do planeta não poderia fornecer a todas as 7 bilhões de pessoas os alimentos a que estão acostumadas. Na verdade, quase metade do nitrogênio encontrado nos músculos e tecidos de nosso corpo surgiu em alguma fábrica de fertilizantes.
Todavia, esse milagre moderno tem um custo. O escoamento do excesso de nitrogênio sufoca a fauna silvestre em lagos e estuários, contamina os lençóis freáticos e contribui para o aquecimento global. Enquanto um mundo esfomeado se prepara para receber mais bilhões de bocas que precisam ingerir proteínas ricas em nitrogênio, o que restará de ar e água não poluídos em meio à crescente demanda por terras férteis?
O dilema do nitrogênio é explícito na China, um país que adora sua comida e teme a possibilidade de exaurir as fontes de abastecimento. Para um visitante, tal ansiedade soa despropositada. No restaurante San Geng Bi Feng Gang, nos arredores de Nanquim, acompanho, assombrado, o desfile de pratos: peixe no vapor, costeletas de carneiro fritas, sopa de flor de crisântemo e ovo, talharim com batata-doce, brócolis frito, inhame e vasilhas fumegantes de arroz.
“Você sempre se alimenta bem assim?”, pergunto ao cientista Liu Tianlong, um especialista em agricultura que está me apresentando aos cultivadores da vizinhança. O sorriso de menino desaparece e, de repente, uma sombra tolda suas feições. “Quando eu era pequeno, ficava contente ao receber três vasilhas de arroz."
Liu cresceu logo após a grande fome que assolou a China de 1959 a 1961, na qual se estima que tenham morrido 30 milhões de pessoas. A seca desempenhou um papel, mas o responsável pela catástrofe foi o presidente Mao, e seus caprichos. Promovido pelo líder chinês, o Grande Salto Adiante pressupunha a coletivização da produção agrícola e obrigou os camponeses a entregar as colheitas para uma burocracia centralizada.
Mesmo atenuada, a escassez de alimentos prosseguiu até o fim da década de 1970, quando os cultivadores retomaram o controle de suas safras. “No prazo de apenas dois anos, quase que da noite para o dia, havia comida em profusão”, relembra Deli Chen, que, menino, testemunhou essas reformas em um vilarejo produtor de arroz na província de Jiangsu. Hoje, ele é especialista em solo da Universidade de Melbourne, na Austrália.
pelos campos em que será plantada a safra de inverno de trigo. A China é o maior produtor e também o maior consumidor de adubo no mundo. O país chega a usar 60% mais nitrogênio
que o necessário - Foto: Peter Essick
No entanto, os lavradores chineses logo toparam com outra barreira: os limites das terras cultiváveis. A população da China incorporou 300 milhões de pessoas entre 1970 e 1990. Não foi nada fácil para a agricultura tradicional do país atender a essa demanda.
Song Linyuan, um lavrador idoso porém lépido de um povoado a nordeste de Nanquim, ainda se lembra da época em que mantinha seu meio hectare cultivável tão fértil quanto possível: fazia a compostagem do lixo doméstico e usava o esterco de seus porcos e galinhas. Isso significava o acréscimo de 110 quilos de nitrogênio por hectare ao ano. Ele colhia de 2 950 a 3 750 quilos de arroz por hectare. Essa é uma safra respeitável, uma produtividade melhor que em muitas regiões do globo. Mas hoje ele consegue o dobro disso: 8 170 quilos por hectare – resultado com que muitos produtores só conseguem sonhar.
O que fez a diferença? “Adubos melhores”, diz ele. Estamos sentados em uma loja em meio a outros agricultores. A resposta de Song Linyuan desencadeia uma discussão acalorada. Alguns concordam que o adubo é crucial; outros consideram mais importantes as sementes melhoradas. Na verdade, as duas tecnologias estão associadas. As variedades de arroz e trigo de alta produtividade desenvolvidas nas décadas de 1950 e 1960 apenas poderiam exibir todo o seu potencial caso recebessem outra dose de nitrogênio.
As autoridades chinesas procuraram assegurar que essas safras fossem bem adubadas. Entre 1975 e 1995, construíram centenas de usinas de nitrogênio. A fabricação de fertilizantes foi quadruplicada pelo país, e a China transformouse no maior produtor mundial. Song Linyuan agora usa cinco vezes mais fertilizante que antes. Os campos estão saturados de ureia – uma forma seca de nitrogênio –, lançada em punhados de grânulos alvos como neve entre os brotos verdes. Isso equivale a 600 quilos de nitrogênio por hectare. Os cultivadores de legumes usam ainda mais fertilizante. Alguns chegam a aplicar 1 ou 2 toneladas por hectare.
Poucos agricultores acreditam que isso pode ser danoso, mas os cientistas contam outra história. “O adubo nitrogenado é usado em excesso, em uma proporção de 30% a 60%, em campos de cultivo de manejo intenso”, diz Xiaotang Ju, da Universidade Agrícola da China em Pequim. Aplicados na terra, os compostos nitrogenados se dispersam pelo ambiente, alterando nosso mundo, não raro de maneira indesejável. Parte do nitrogênio é carregada das plantações para os rios ou se dilui na atmosfera. Outra porção é ingerida, sob a forma de grãos, por seres humanos ou animais de criação, mas, em seguida, retorna ao ambiente como dejeto ou excremento.
Deli Chen lembra-se das pescarias que fazia quando pequeno. “O rio tinha água translúcida”, conta. Mas aí, por volta de 1980, “era impossível ver os peixes”. A turvação devia-se em parte à proliferação de fitoplâncton, um sinal de que a água se tornou eutrófica (sobrecarregada de nutrientes). Um levantamento de 40 lagos chineses constatou que metade deles apresentava quantidade excessiva de nitrogênio ou de fósforo – com frequência, o adubo com fósforo é o responsável pela proliferação de algas nos lagos.
Um caso emblemático é o do lago Tai, terceiro maior do país, que, com frequência, é tomado por imensas proliferações de cianobactérias tóxicas. Em 2007, uma dessas florescências desenfreadas contaminou o suprimento de água a 2 milhões de moradores da cidade de Wuxi.
No solo há bactérias que se alimentam de nitratos e podem converter essas modalidades danosas de nitrogênio em sua forma original, e ambientalmente inócua, que constitui 80% de nossa atmosfera. Todavia, mesmo esse processo não deixa de apresentar problemas, pois essas bactérias também liberam óxido nitroso, um gás que contribui para o efeito estufa. “Resolver o problema da sobrecarga de nutrientes é meu sonho”, diz Xiaotang Ju, membro da “família do nitrogênio” na China, uma rede informal de cientistas dedicados a essa tarefa hercúlea. O patriarca da causa, Zhu Zhaoliang, alarmou os altos dignitários do governo ao fazer uma palestra, em 1998, sobre os perigos da poluição causada pela agricultura. O então presidente da China, Jiang Zemin, reagiu dizendo que não fazia ideia que a atividade agrícola podia ser tão danosa.
Esses cientistas começaram a trabalhar com grupos pequenos de lavradores, mostrando a eles que a redução do adubo, além de não diminuir as colheitas, pode ser vantajosa em termos financeiros. Também incentivam a compostagem e orientam a usar os adubos sintéticos apenas nos casos de maior necessidade. O obstáculo é que parte dos cultivadores não se dedica à atividade em tempo integral. Eles não têm interesse em economizar reduzindo o uso de adubo. Preferem poupar tempo e garantir seus empregos urbanos.
O temor de uma escassez de alimentos ainda assombra a imaginação dos chineses, o que faz com que as preocupações ambientais sejam suplantadas. Huang Jikun, diretor do Centro de Política Agrícola na China, tenta convencer as autoridades de que tal preocupação é despropositada. “Hoje a China tem mais segurança alimentar que nos últimos 5 mil anos!”, diz ele.
É provável que a China – e o resto do mundo – passe a usar mais, e não menos, nitrogênio nos próximos anos. Populações continuam a crescer, assim como o acesso à carne. A alimentação de rebanhos suínos ou bovinos requer um volume de produtos agrícolas bem maior do que se os cereais fossem usados na nutrição humana. “Se os chineses modificarem sua dieta para que fique mais parecida com a ocidental, a pressão sobre o ambiente será enorme”, comenta Xiaotang Ju.
Há um vislumbre de solução em uma fazenda perto da localidade de Harlan, no estado americano de Iowa. Ali, 90 cabeças de gado pastam em um campo viçoso, e centenas de porcos revolvem a terra, em meio a camadas de palha, rodeados de plantações de alfafa, milho, soja, aveia e cevada.
Ron e Maria Rosmann não aplicaram adubo nitrogenado nessas plantações. Pelo contrário, ele é acrescentado por meio de bactérias, que fixam o nitrogênio e vivem em nódulos nas raízes de leguminosas, como a soja e a alfafa (e também uma safra de cobertura de trevo-azedo no outono), e depois o liberam no solo, antes do plantio de milho na primavera. Parte desse nitrogênio é absorvida pelo milho, alimento para os porcos. O grosso dele acaba em esterco, que é levado de volta para adubar os campos.
O ciclo é novamente reiniciado. “Um de nossos objetivos é manter um sistema fechado”, diz Ron. “Somos um exemplo de como deve ser o plantio orgânico.”
Um agricultor amish espalha esterco e palha de seu celeiro em um campo recém colhido. O esterco fornece nitrogênio para a plantação do ano seguinte. Se aplicado da maneira correta, o fertilizante caseiro não adicionará o excesso de nitrogênio às fontes de água loc:ais - Foto: Peter Essick
Entramos por uma lavoura de milho, entre pés bem mais altos que nós. “Deve haver 5 toneladas de milho aqui. Há muita gente que diz: ‘Vocês, agricultores orgânicos, não vão conseguir alimentar o mundo’. Não é verdade. Veja esta plantação!”, comenta Ron com entusiasmo.
No entanto, também há desvantagens em seus métodos. Esse tipo de cultivo exige muito trabalho, e a natureza não tem a pressa de uma usina de nitrogênio. As safras que permitem o acúmulo do elemento no solo, como a de alfafa, não são tão rentáveis nem alimentam tanta gente, como as de milho, que consomem muito nitrogênio.
O Brasil também tem desenvolvido a agricultura orgânica, apesar de o uso de fertilizantes nitrogenados não ser problema tão grande por aqui – o país utiliza quantidade menor que a média global. Isso porque a soja, principal produto agrícola, prescinde desse tipo de fertilizante. Além disso, explica Antonio Dechen, da Universidade de São Paulo, “técnicas como o plantio direto, que preserva o solo da exposição direta a sol e chuva, e a inoculação de bactérias fixadoras do gás nitrogênio presente na atmosfera permitem aos produtores abrir mão do uso de nitratos”.
Já os Estados Unidos, com seis vezes mais terras aráveis por pessoa que a China, podem se dar ao luxo de plantar safras menos produtivas que protegem o ambiente, caso alguém esteja disposto a pagar por elas. O esquema funciona para o casal Rosmann, que recebe alguns recursos do governo e vende produtos orgânicos por preços altos.
Mas será que todos estarão dispostos a pagar caro? Poderiam os métodos orgânicos alimentar o país de maior população no mundo? Em Nanquim, Zhu Zhaoliang, em sua sala no Instituto das Ciências do Solo, dá uma gargalhada ao ouvir a pergunta. “Não resolve para a China.”
É provável que, no entanto, haja uma posição intermediária – colheitas excelentes, mas sem tanta poluição por nitrogênio – e algumas das plantações mais estudadas no mundo mostram o caminho a seguir. Esses campos de cultivo, cada qual com 1 hectare exato, fazem parte da Estação Biológica Kellogg, da Universidade Estadual de Michigan. Durante 20 anos, tais lotes têm produzido milho, soja e trigo em ritmo constante, proporcionando uma comparação de quatro maneiras de cultivar a terra, desde a costumeira até a orgânica. Tudo o que entra ou sai dos terrenos é medido com cuidado: chuva, adubo, o óxido nitroso emitido pelo solo, a água que se infiltra no lençol freático e, por fim, a colheita.
Phil Robertson, um dos responsáveis pela montagem desse experimento de longa duração, me acompanha na visita a essas plantações. Ele está ansioso para revelar dados novos e “muito surpreendentes”. Ao longo dos últimos 11 anos, cada um dos lotes cultivados de acordo com as recomendações regulares para aragem e adubação liberou 680 quilos de nitrogênio por hectare nos rasos lençóis freáticos da região. “Portanto, metade do adubo usado se perde”, diz Robertson. Tal perda é bem menor que a registrada na China. Mesmo assim, quando multiplicada pelos milhões de hectares cultivados nos Estados Unidos, é suficiente para contaminar os aquíferos, saturar de nutrientes o rio Mississippi e criar uma imensa zona morta no golfo do México.
As plantações orgânicas no experimento de Robertson, por sua vez, aquelas que não receberam nem adubo nem esterco comerciais, perderam um terço do nitrogênio usado – mas tais campos também produziram um quinto a menos de cereais. Curiosamente, as plantações que receberam pequenas quantidades de adubo, mas também foram protegidas por safras orgânicas de inverno, proporcionaram o melhor dos dois mundos: a produtividade média foi equivalente à dos cultivos normais, só que com perda de nitrogênio bem menor, quase no nível dos campos orgânicos. Segundo Robertson, se os fazendeiros americanos conseguissem diminuir as perdas de nitrogênio em níveis similares, os pântanos e cursos d’água recuperados poderiam dar conta de eliminar o restante. Tal como na China, porém, para muitos agricultores, não é fácil mudar. Quando está em jogo a sobrevivência da família, pode parecer melhor recorrer a uma quantidade maior, e nunca menor, de adubo.
Da perspectiva da África, o problema do uso excessivo de adubo comercial parece restrito às nações ricas. Os lavradores africanos usam quantidades reduzidas de fertilizantes – em média, apenas 7 quilos por hectare. Práticas alternativas, como adubação com esterco ou safras de leguminosas, também têm sido raras.
Nas áreas rurais da África, muitos plantadores acabaram submetidos a um conjunto de círculos viciosos. Com medo da fome, eles se concentram em safras, como as de arroz ou milho, que oferecem o máximo de calorias, mas tendem a retirar nutrientes do solo. Nessas terras exauridas, as colheitas são piores ano após ano, impedindo que os agricultores tenham recursos para a compra de adubo. A pouca demanda desestimula a produção local e o fertilizante importado é caro.
Os solos africanos estão solapados. As reservas naturais de fertilidade – os nutrientes armazenados na matéria orgânica de raízes e folhas em decomposição durante os séculos anteriores – diminuem à medida que a agricultura extrai mais nitrogênio, fósforo e potássio do que repõe. Isso deixa a terra incapaz de alimentar as pessoas – “um roteiro para o desastre no longo prazo”, segundo o Banco Mundial.
O rendimento médio das plantações de cereais na África subsaariana gira em torno de 1 tonelada por hectare, um quinto da média chinesa. Quase todos estão de acordo: os agricultores africanos precisam de volume maior de nitrogênio para melhorar suas colheitas e a vida. No entanto, há um debate exaltado e amargo sobre qual deveria ser a origem desse nitrogênio.
Para alguns, como Jeffrey Sachs, do Instituto da Terra na Universidade Colúmbia, o aumento na produção agrícola requer nova adição de adubo comercial e, se os agricultores africanos não têm condições de comprá-lo, então, deveriam ser subsidiados pelas nações ricas. Em 80 povoados distribuídos por uma dezena de países, o Projeto Povoados do Milênio, dirigido por Sachs, distribui sacos de adubo e sementes melhoradas. Em povoados de Tanzânia, Quênia e Malauí, a produção de cereais dobrou da noite para o dia.
Em 2006, o governo do Malauí passou a fornecer adubo barato à metade dos agricultores do país. A produção de milho dobrou – embora isso se deva também a uma boa temporada de chuvas. Esses programas, contudo, estão ameaçados por dúvidas quanto ao futuro. Subsídios para fertilizantes foram experimentados em vários lugares na África durante as décadas de 1970 e 1980, mas acabaram abandonados por serem muito dispendiosos e fonte de corrupção. O atual programa de subsídios do Malauí encontra problemas – como a falta de recursos estatais.
Ainda que grande parte do planeta sofra com os efeitos deletérios do excesso de nitrogênio, isso está longe de acontecer nas terras de cultivo africanas. A leguminosa Faidherbia albida oferece uma solução alternativa. Suas folhas, assim como as bactérias que vivem nos nódulos da raiz da árvore, fertilizam as plantações - Foto: Peter Essick
“O continente africano não tem como financiar quantidades maciças de adubo”, diz a agrônoma Sieglinde Snapp, da Universidade Estadual de Michigan. Uma abordagem viável, segundo ela, seria um uso maior de plantas fixadoras do nitrogênio. Milhares de famílias no Malauí começaram a cultivar feijão-guandu e amendoim em suas terras, substitutos de parte dos milharais. Trata-se de um experimento de dez anos, iniciado por hospitais, agricultores e agrônomos locais.
Como o guandu e o amendoim tornam o solo fértil, a colheita de milho na safra seguinte é maior – o que compensa o fato de uma área menor ter sido plantada com milho. “Menos milho resulta em mais milho”, diz Sieglinde. Além disso, a colheita adicional de feijão-guandu possibilitou uma dieta nutritiva e proteica. “Eles tiveram de aprender a usar as leguminosas. Foram 20 anos de trabalho. As pessoas mudaram seus pratos cotidianos”, conta a agrônoma.
A conclusão de Sieglinde – de que a produção e a conservação de nitrogênio vão exigir conhecimento e paciência consideráveis – coincide com a opinião de muita gente empenhada nessa busca mundial. Quando perguntado sobre o que é determinante para a agricultura chinesa, o especialista em solo Zhu Zhaoliang responde: “Mais escala” – ou seja, plantações maiores e bem manejadas. Ron Rosmann, em Iowa, explica que o cultivo sem o acréscimo de nitrogênio comercial “requer manejo, trabalho e mais atenção aos detalhes. Somos um tanto fanáticos”.
Um século atrás, quando o químico Fritz Haber aprendeu a extrair nitrogênio do ar, os fertilizantes sintéticos pareciam um atalho para se evitar a escassez, pois asseguravam o suprimento do nutriente essencial para a agricultura. No entanto, são evidentes os limites no uso do nitrogênio. Agora, as inovações que nos salvarão – e ao planeta – talvez não saiam do laboratório químico. É possível que venham de agricultores e plantações em todas as partes do mundo.
por Dan Charles
Fonte:http://viajeaqui.abril.com.br/materias/fertilizantes-pode-a-agricultura-destruir-nosso-planeta?pw=1
Para produzir safras abundantes, as plantações necessitam de nitrogênio. O escoamento superficial do fertilizante é reduzido nesta fazenda de Wisconsin, nos Estados Unidos, pelas faixas de alfafa plantadas entre os pés de milho e soja.
Gramados estão se tornando mais prevalentes nos parques e bairros residenciais da China. Fazendas como esta, em Changshu, produzem a relva que utiliza muito fertilizante. Nos Estados Unidos, gramados e jardins respondem por quase 10% da quantidade de fertilizante usada no país.
As galinhas garantem o fertilizante nesta fazenda da Pensilvânia, nos Estados Unidos. Os galinheiros são movidos todos os dias para que o esterco seja bem distribuído e não carregado à baía de Chesapeake.
Quando o espetáculo das sereias em Weeki Wachee Springs, na Flórida, estreou, em 1947, as belas mulheres nadavam entre os ramos de valisnéria-comum. Hoje, as algas alimentadas por adubo nitrogenado vindo de plantações e jardins expulsaram as plantas nativas.
Um cartão-postal de 1949 oferece um vislumbre de Weeki Wachee Springs quando o lugar era cheio de plantas nativas.
O bioquímico Pierre Henkart (no barco) confere o riacho Asquith perto da baía de Chesapeake para avaliar a claridade da água. O fitoplâncton, alimentado em parte pelo excesso de fertilizantes, ajudou a transformar o riacho em uma mistura cor de chá e criou uma zona morta, onde a vida é sufocada por falta de oxigênio. A zona morta é recorrente a cada verão, diz Henkart, que monitora o lugar há sete anos.
Esta fábrica na Nigéria é a única que produz fertilizante de ureia de baixo custo em toda a África subsaariana. Para alguns cientistas, o uso excessivo de adubo em outras regiões não deve ser obstáculo para que os agricultores africanos desfrutem dos benefícios desses fertilizantes.
O alaranjado claro na imagem em infravermelho mostra onde este milharal em Iowa tem menos nitrogênio. Os fazendeiros usam imagens assim para controlar a aplicação de adubo e evitar o escoamento que polui rios e lagos.
Uma amostra de água retirada da zona morta do golfo do México tem bem pouco oxigênio em comparação com uma amostra normal.
Uma amostra de água normal do golfo do México
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